Profissional da educação: sem garantia de permanência e formação, há de fato um projeto de educação?

                                                           

                     Erineu Foerste*

                                                      Mônica Nickel*

                                                                                   Roseli Gonoring Hehr*



Diante de tantas questões que permeiam e interferem no processo educativo, temos  o profissional da educação, ou seja, o educador,  como sujeito essencial para que de fato seja garantido ao educando o direito ao conhecimento que a escola se propõe a mediar.

No entanto, como veremos nos textos a seguir, a situação da maioria dos educadores que atuam nas escolas de nosso país apresenta-se com um índice significativo de profissionais temporários, que, como sabemos, não têm   a garantia do retorno as escolas ou as redes onde atuam, o que dificulta um sentimento de pertença aquele contexto, sentimento esse  fundamental para um comprometimento maior com os educandos, famílias e comunidade.

E se pensarmos nas escolas do campo, esta situação pode ficar ainda pior, que devido as suas particularidades, muitos educadores preferem não enfrentar os desafios das longas distâncias, estradas de chão, salas multisseriadas, falta de recursos tecnológicos, como internet entre outras.

E nesse contexto, reforça-se a presença de profissionais contratados temporariamente e em muitos casos sem a devida formação, uma vez que para garantir o direito do aluno à educação autoriza-se que pessoas sem a devida licenciatura  atuem como professores..

Pensar políticas públicas que garantam educadores concursados e licenciados são  fundamentais para que seja garantido o mínimo necessário  e previsto nos planos/projetos educacionais  para que se cumpra de fato a missão de educar.

Nesse sentido, podemos destacar algumas ações do Ministério da Educação que dizem respeito à valorização de docentes, como o Plano Nacional de Formação de Professores (com cursos de licenciatura e formação pedagógica), o Pibid (programa de concessão de bolsas a alunos de licenciatura) e a Universidade Aberta do Brasil, que oferta cursos de aperfeiçoamento a professores em áreas como matemática, gestão escolar e educação integral, entre outros.

Não obstante, a valorização também passa pela questão salarial, que a partir da Lei nº11.738/2008 que estabelece o Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do magistério, temos um avanço. No entanto, ainda modesto para colocar a profissão de educador como um atrativo que possa fazer com os melhores alunos de nossas escolas desejem ser professores,  não só pela aptidão, mas também pelo incentivo financeiro, como ocorre em outras profissões.

 

Levantamento do UOL faz mapa de contratação temporária de docentes

Em sete Estados brasileiros, o número de contratos temporários de professores da rede estadual ultrapassa a quantidade de contratos efetivos (concursados ou estáveis). São eles: Espírito Santo (71%), Mato Grosso (66,1%), Acre (62,9%), Ceará (60,2%), Mato Grosso do Sul (60,1%), Santa Catarina (59,8%) e Paraíba (51,9%). As informações foram obtidas a partir de levantamento do UOL nos microdados do Censo Escolar 2012.

Segundo especialistas ouvidos pelo UOL, o alto índice de professores temporários (com menos direitos que os profissionais efetivos) prejudica o trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas e o desempenho dos alunos.

Todas as 27 secretarias estaduais de Educação foram questionadas a respeito dos números. Destas, apenas sete retornaram. Elas justificam que os números do levantamento do UOL têm como base o Censo Escolar de 2012, que estaria defasado. No entanto, esses são os dados nacionais mais recentes e foram divulgados em 2013.

Redes estaduais têm mais contratos temporários de docentes do que as municipais

As redes estaduais de ensino possuem mais contratos temporários de professores do que as redes municipais, segundo informações obtidas a partir dos microdados do Censo Escolar 2012. No geral, 31,3% dos contratos das redes estaduais são temporários; já nas redes municipais, o número cai para 25%.

Nota técnica

As informações foram obtidas a partir dos microdados do Censo Escolar 2012, com tabulação realizada pelo UOL. Foram considerados todos os tipos de contrato diferentes por professor e por rede. Isso significa que um mesmo professor pode ter mais de uma contratação: por exemplo, pode ser concursado em uma rede estadual e temporário em uma municipal. Foram contabilizados somente os profissionais que exercem a função de "docente" na escola – no banco de dados há também as funções "auxiliar de educação infantil", "profissional/ monitor de atividade complementar" e "tradutor intérprete de Libras", que foram retiradas desta análise. Recortes diferentes podem levar a resultados distintos

Enquanto as redes estaduais de sete Estados têm mais contratos temporários do que contratos efetivos, nas redes municipais apenas o Acre apresenta índice de temporários superior a 50%.

As redes municipais são responsáveis pela maior parte das contratações, com um total de 1.110.076 de contratos de professores (concursado/efetivo/estável, temporário, terceirizado e CLT). Nas redes estaduais, o número total de contratos fica em 754.833. 

Em média, três em cada dez contratos nas redes estaduais são temporários, de acordo com o levantamento. As outras modalidades possíveis, segundo o Censo, são: efetivo (concursado ou estável), terceirizado ou em regime de CLT.

Professores com contratos temporários não têm estabilidade e possuem menos direitos que os efetivos e concursados. 

Segundo o levantamento, em outras 15 redes estaduais o número de contratos temporários representa de 45% a 20% do total de contratações. Em quatro Estados, o percentual varia de 18% a 14%. O Rio de Janeiro apresenta o índice mais baixo de contratações temporárias, com 3,5%. 

Segundo o promotor de Justiça, João Paulo Faustinoni e Silva, a regra constitucional geral é a de contratação de professores por concurso público. "A Constituição, todavia, admite a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Como a própria norma afirma, não há número razoável para tais contratações, pois devem ser excepcionais e temporárias", diz o promotor.

Política permanente

Luiz Carlos Novaes, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), avalia que sempre haverá professores temporários em qualquer rede. "Os professores se aposentam, saem para estudar, entram em licença maternidade ou licença médica. O índice é aceitável desde que seja temporário. A existência do temporário na rede deve ser transitória, mas não é. Além de ser permanente, ela ainda cresce", diz Novaes.

O professor Ocimar Alavarse, da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo), acredita que o processo de municipalização do ensino influencie no maior número de professores temporários nas redes estaduais.

"Muitos governos estaduais estão empenhados na municipalização [do ensino]. Para que eu vou fazer um concurso, se mais adiante eu não vou querer esses professores? Estão aguardando os processos de municipalização para que os professores contratados se aposentem. Os temporários são mais descartáveis", disse Alavarse.

Para Cleuza Repulho, presidente da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), as redes estaduais usam mais contratos temporários por causa do custo. "A questão maior é o custo, com o estatutário [professor concursado] você tem uma série de encargos, que faz diferença [para a administração]", disse Cleuza. Outro problema apontado pela dirigente é a falta de professores especialistas -- os temporários de física ou química, por exemplo, ajudam a tampar a falta desses docentes no ensino médio, uma etapa de responsabilidade quase total das redes estaduais.

Outro lado

Questionadas pelo UOL, apenas sete das 27 secretarias estaduais de Educação comentaram os percentuais. De modo geral, elas divergem dos números do Censo ora alegando erro de informação por parte das escolas (cada escola informa os dados diretamente ao MEC) ora criticando a defasagem dos números (que foram coletados em maio de 2012).

Maioria dos docentes do ensino médio não tem formação na área em que atua

A maioria dos professores do ensino médio no Brasil (51,7%) não tem licenciatura na disciplina em que dá aulas. Outros 22,1% dos docentes que estão nas salas do ensino médio não têm qualquer licenciatura. Os dados do Censo Escolar 2013 foram compilados pela ONG Todos Pela Educação. 

O Nordeste é a região em que faltam mais professores licenciados nas áreas específicas das disciplinas - 66% não são formados na área em que atuam. No Centro-Oeste, o índice é de 60,5%. Na região Norte, o percentual é de 55%. As regiões Sul (41,9%) e Sudeste (42%) são as com as menores carências de professor.

A disciplina com maior deficiência é artes em que apenas 14,9% dos professores são licenciados. Língua portuguesa é a disciplina com mais professores dentro da sala de aula que se formaram na área (73,2%). Em física, 80,8% dos docentes não são formados na área; na disciplina de química, o índice é de 66,3%. 

Entre os que não têm licenciatura na disciplina em que dá aulas entram professores que não são especialistas na área --como o professor de física que dá aulas de química ou o formado em ciências sociais que dá aulas de geografia. Esses casos são permitidos pelo MEC (Ministério da Educação).

Há ainda o problema dos profissionais formados em outras áreas que estão nas salas de aula, como o administrador que dá aulas de língua portuguesa no ensino médio. Isso é comum entre professores temporários.

Nos anos finais do ensino fundamental, 21,5% não tem qualquer formação no ensino superior e 35,4% dos professores não cursaram licenciatura. 

Há também 67,2% dos docentes não são habilitados nas disciplinas que lecionam. Mais uma vez é o Nordeste a região com maior deficiência (82,4%). No Norte, 81,9% dos professores dos anos finais do ensino fundamental não são formados nas áreas que atuam. No Centro-Oeste, o índice é de 64,3%. 

Nessa etapa de ensino, apenas 28,1% dos professores de geografia são formados na área. Em história, o índice é de 31,6%, e em ciências, o percentual é de apenas 34,2%.

Em março, uma auditoria do Tribunal de Contas da União, feita em parceria com tribunais de Contas dos Estados, já tinha indicado a carência de 32 mil professores com formação específica nas 12 disciplinas obrigatórias do nível médio. 

Com salários baixos, um dos problemas é que a docência não atrai os jovens no ensino superior. Neste ano, o piso nacional do professor foi fixado em R$ 1.697,39, para uma jornada de 40 horas. 

Mesmo entre os que decidiram seguir carreira na sala de aula, a evasão da educação básica é cada vez maior. Insatisfação no trabalho e desprestígio profissional são alguns dos motivos apontados por quem prefere abandonar a sala de aula.

Em outubro do ano passado, uma pesquisa internacional mostrou que, entre 21 países, o Brasil fica em penúltimo lugar em relação ao respeito e à valorização dos seus professores.

A formação e a valorização do professor é uma das metas do PNE (Plano Nacional de Educação), que está em discussão na Câmara dos Deputados e deve ser votado no dia 22 de abril

Meta 17- Valorização do professor. Equiparar o rendimento médio dos profissionais do magistério das redes públicas de educação básica ao dos demais profissionais com escolaridade equivalente, até o final do sexto ano de vigência do PNE.



* Professor Associado da Universidade Federal do Espírito Santo - UFES e membro do Colegiado do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFES.

* Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo -UFES, na linha de pesquisa Cultura, Currículo  e Formação de Educadores. Professora da Rede Municipal de Domingos Martins.

* Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo -UFES, na linha de pesquisa Cultura, Currículo  e Formação de Educadores. Professora da Rede Municipal de Vitória.

 

 

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